Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

O setor sucroalcooleiro lidera o ranking de \'escravos\' libertados pelo governo federal em todo o país em 2008. No total, 2.553 pessoas saíram de condições de trabalho equivalentes à escravidão no setor durante o ano passado. Isso equivale a 49% do total de 5.224 trabalhadores retirados em 2008. A pecuária ocupa o segundo lugar no ranking, com 1.026 libertos (20% do total).

 

 

Piero Locatelli
Do UOL Notícias
Em Brasília (DF)

 
Os dados, levantados pela Comissão Pastoral da Terra, foram divulgados hoje em estudo da ONG Repórter Brasil sobre as condições do setor sucroalcooleiro no país.

Marcel Gomes, coordenador da pesquisa, diz que o número reflete a grande quantidade de trabalhadores escravos encontrados em cada lugar em que há produção extensiva de cana.

Casos de trabalho escravo em 2008 no Brasil

Atividade

Denunciados

Fiscalizados

Envolvidos

Liberados

Desmatamento

7 - 2%

7 - 3%

99 - 1%

83 - 2%

Pecuária

137 - 48%

85 - 40%

1.740 - 25%

1.026 - 20%

Reflorestamento

19 - 7%

18 - 8%

264 - 4%

248 - 5%

Extrativismo

5 - 2%

5 - 2%

68 - 1%

49 - 1%

Cana

19 - 7%

19 - 9%

2.553 - 36%

2.553 - 49%

Outras
lavouras

35 - 12%

30 - 14%

876 - 12%

720 - 14%

Carvão

48 - 17%

38 - 18%

1.252 - 18%

410 - 8%

Outros e
não informado

14 - 5%

12 - 6%

201 - 3%

155 - 3%

TOTAL

284

214

7.053

5.244

 

·         Elaboração: Comissão Pastoral da Terra (CPT), até 31/12/2008

 

O estudo aponta que o número de casos denunciados na pecuária é maior do que na cana. Porém, como a produção neste setor costuma ser mais intensiva, a quantidade de libertos tende a ser menor em cada apreensão feita.

2008 trouxe piora para os trabalhadores
A pesquisa mostra uma piora na condição dos trabalhadores do setor da cana em 2008. No ano passado, o aumento dado aos trabalhadores foi menor que a inflação no período.

Gomes cita São Paulo como exemplo dessa piora. No Estado, os trabalhadores tiveram um aumento médio de 7 pontos percentuais no salário. A inflação, porém, foi de 16,1%. Desta forma, o trabalhador teria o seu poder de compra reduzido.

O resultado de 2008 quebra uma série de sete anos em que os trabalhadores tiveram ganhos reais no salário. Segundo o pesquisador, isso reflete a postura das empresas diante da crise e da baixa do preço do álcool e do açúcar.

"A corda estourou do lado mais fraco. No momento de euforia, as usinas estavam construindo. Na dificuldade, quem paga o pato é o trabalhador que ganha um reajuste insuficiente para se sustentar", diz Gomes.

Segundo o estudo, também houve a diminuição relativa do valor pago aos trabalhadores por cana cortada. Desde 2000, o preço dela subiu quase doze pontos percentuais. O preço pago subiu somente 9,8%.

São Paulo tem condições "menos piores"
Em São Paulo, mais de 90% dos trabalhadores do setor tem carteira assinada. Segundo Gomes, esse é o resultado "menos pior" entre os Estados.

"Em São Paulo há sindicatos mais fortes, mais fiscalização, sociedades civis mais organizadas. Conforme você se afasta da mancha produtiva de São Paulo, a situação é mais inóspita", diz ele.

Segundo ele, em São Paulo ainda existem muitos problemas como a falta de respeito ao direito de greves, em que trabalhadores são muitas vezes demitidos sem justa causa. No restante do país, ainda falta uma organização sindical e uma fiscalização maior.

O pesquisador defende, além de maior fiscalização e de mais iniciativas dos trabalhadores, uma consciência maior por parte das empresas compradoras de cana.

"A BR, a Ipiringa, a Esso... todas elas deviam fazer exigências para os trabalhadores em termos de efeito e lei", diz ele. Gomes lembra do pacto contra o trabalho escravo, em que várias empresas assinaram um termo de não comprar produtos de fornecedores ligados à prática.

Amazônia foi desmatada
Além dos problemas trabalhistas, o relatório também mostra uma degradação ambiental causada pela produção da cana. A área do plantio de cana cresceu 23,5% por cento nos Estados que tem área da Amazônia.

"Durante 2008 inteiro o governo ficou falando que ia fazer o zoneamento ecológico e que era para todo mundo ficar tranquilo. O problema é que o zoneamento ainda não saiu. Isso leva anos de espera para surtir efeito", critica Gomes.

 

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