Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Após anos de conflitos, violência, ameaças, clamores por justiça e por terra, além do assassinato de uma criança de 9 anos, finalmente as 77 famílias da comunidade camponesa posseira de Roncadorzinho, situada em Barreiros, Mata Sul,  podem respirar aliviadas e celebrar o fruto da sua luta e resistência. No último dia 3 de outubro, foi concluído o processo de desapropriação do imóvel com a assinatura do Governo de Pernambuco.  O momento contou também com a presença do Ministério Público de Pernambuco (MPPE), representado pelo promotor Dr. Leonardo Caribé, e da Procuradoria-Geral do Estado (PGE), representada pelo Dr. Almir Bezerra, além de representantes da comunidade, da CPT, da Fetape e da Comissão Estadual de Acompanhamento de Conflitos Agrários (CEACA).


Setor de comunicação da CPT NE2

O Engenho Roncadorzinho possui uma área de aproximadamente 690 hectares, onde vivem as 77 famílias agricultoras descendentes de trabalhadores rurais, muitos deles credores judiciais da antiga Usina Santo André. Durante anos, essas famílias enfrentaram ameaças de despejo, destruição de lavouras, intimidações, perseguições e tantas outras violências que marcaram a luta pela permanência na terra daquelas famílias. Um dos episódios mais marcantes desse conflito chocou todo o Brasil: o assassinato da criança Jonatas de Oliveira, de 9 anos, em fevereiro de 2022, dentro da sua casa. O alvo era seu pai, Geovane da Silva Santos, então presidente da associação comunitária. Ele também foi baleado, mas sobreviveu aos ferimentos.

Após o crime, um levante popular e camponês cobrou do Estado de Pernambuco a desapropriação da área para fins de Reforma Agrária, além de medidas imediatas para conter a violência no campo e o cenário de insegurança, pavor e medo que restou às famílias após o assassinato do menino Jonatas. No dia 19 de agosto de 2022, foi publicado no Diário Oficial do Estado de Pernambuco o Decreto nº 53.376, que declarou de interesse social, para fins de desapropriação, o Engenho Roncadorzinho. No entanto, a etapa definitiva, realizada no início de outubro, ocorre mais de dois anos depois da publicação do decreto, em razão de diversos entraves jurídicos.

Geovani Leão, agente pastoral e membro da coordenação da CPT NE2 ressaltou que “a conquista da terra pela comunidade de Roncadorzinho é de extrema importância, porque traz o sentimento de que a justiça foi feita. A justiça veio na forma de reconhecimento do direito à terra. Por isso, o nome do assentamento será Jonatas. Não bastava só prender os criminosos, precisava também fazer justiça com a terra. Outro sentimento que traz é o ânimo de seguir lutando na terra. Como é bom ver os agricultores e as agricultoras animados em recomeçar suas vidas, ampliar o plantio, fazer a terra, que antes só produzia cana, produzir alimentos. Então, é muito bom ver que as famílias podem dar continuidade às suas vidas, agora com a terra conquistada”.  Para o agricultor Geovani da Silva, pai do menino Jonatas,“essa vitória é por ele e por todas as famílias que nunca desistiram. A justiça foi feita”, destacou.

Roncadorzinho acende a esperança para outras comunidades em conflito na Zona da Mata - A conquista de Roncadorzinho é comemorada com emoção não apenas pelas famílias que residem no local, mas também por diversas outras que vivem em inúmeras comunidades espalhadas pela Zona da Mata e que se solidarizaram com a luta e a dor sofrida pela comunidade nos últimos anos. A conquista, acima de tudo, acende uma esperança e anima a mobilização pela luta pela conquista da terra na região. Atualmente, estima-se que mais de 1.500 famílias camponesas posseiras estejam sob ameaça de despejo ou sob o risco da violência no campo na região. O cenário de conflitos no campo que marca o cotidiano da Zona da Mata a transformou numa das regiões mais violentas de Pernambuco. De acordo com o Centro de Documentação Dom Tomás Balduino, em 2024, a região concentrou 43,9% dos registros de conflitos por terra no estado. O dado evidencia a complexidade e a persistência das disputas fundiárias e a vulnerabilidade das comunidades camponesas, especialmente num contexto de falência ou endividamento de diversas usinas produtoras de açúcar e álcool e de transferência de áreas para empreendimentos agropecuários sem levar em conta os direitos das comunidades posseiras que vivem nas terras há gerações.

Atualmente, há diversos pedidos de desapropriação de imóveis para fins de Reforma Agrária feitos por comunidades que enfrentam conflitos com usinas falidas e detentoras de débitos fiscais e trabalhistas milionários, como as Usinas Bulhões, Frei Caneca, Maravilha e Cruangi. Algumas das comunidades envolvidas são São Bento e Congo, em Itambé; Padre Tiago, em Moreno; e as comunidades Fervedouro, Barro Branco, Várzea Velha, Laranjeiras e Caixa D’Água, em Jaqueira, entre outras. Todas elas lutam e sonham, todos os dias, com o fim da violência no campo e com o direito de viver na terra, pela terra, livre de conflitos e violência.

 

 

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