Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Minutos depois de terem se retirado da sede da Associação dos Avicultores de Pernambuco (Avipe), onde fizeram uma manifestação contra os transgênicos, mulheres da Via Campesina foram surpreendidas pela truculência de soldados da Polícia Militar de Pernambuco.

Três policiais, que foram acionados pela segurança privada da Avipe, ameaçaram as mulheres com tiros e espancaram os homens do movimento que faziam a segurança da marcha.

O ato, que contou com a participação de cerca de 300 mulheres da Via Campesina, foi marcado pela calmaria. As trabalhadoras ocuparam, sem resistência, a sede da Avipe e passaram por lá cerca de duas horas sem que a polícia ou qualquer membro da direção da Associação chegassem. Sem serem recebidas por ninguém - além de não ter nenhum diretor presente os funcionários da Avipe abandonaram a sede - as mulheres da Via Campesina se retiraram do local e deixaram uma cesta com sementes crioulas de milho e uma carta sobre a Jornada de Luta das Mulheres por Soberania Alimentar e contra o Agronegócio, que marca as atividades da Via Campesina em todo país.

Em marcha, as mulheres voltavam para o Parque de Exposições do Cordeiro, onde almoçariam e seguiriam para a atividade da tarde, junto com mulheres de outros movimentos sociais urbanos. Cerca de dez minutos depois, uma viatura policial chegou ao local e, em fração de segundos, três policiais começaram a bater e derrubar os homens que faziam um cordão de isolamento na parte de atrás, para que carros e motos não viessem a entrar na marcha.

Assim que começou o tumulto, as mulheres que também se encontravam no final das fileiras, tentaram evitar que os policiais agredissem os homens que participavam da marcha. Um dos policiais deu tiros para o alto na tentativa de intimidar as mulheres. “Eles queriam pegar os homens. Por ser dia da mulher, os policiais estavam instruídos para se excederem contra nenhuma de nós, porque seria mais complicado, criariam um importante fato político, algo que, para eles, não interessava. Foram instruídos pelo Governo a não reprimir as ações no dia internacional das mulheres”, contou Natália Paulino, da Comissão Pastoral da Terra.

A caminhada ainda prosseguiu por alguns minutos. Os policiais seguiram com a viatura logo atrás do cordão de isolamento, neste momento formado só pelas mulheres. Ao chegaram à Avenida Caxangá, uma das maiores e mais movimentadas do Recife, os policiais receberam reforço da Rocam, grupo especial da PMPE, e de mais três viaturas e iniciaram mais uma investida contra as/os trabalhadoras/es. Apesar de terem ferido várias mulheres a golpes de cacetetes, chaves de braço e tapas, o alvo principal dos PMs foram os homens que participavam da manifestação. “Tanto a ocupação quanto a caminhada foram pacíficas, não houve nenhum tipo de motivação para a violência com que os policiais chegaram à caminhada. Muitos homens foram covardemente agredidos, mesmo depois de imobilizados eles foram ameaçados com tiros e levavam chutes, golpes de cacete e tapas para todo mundo ver, foi terrível, um palco de guerra”, relatou Messilene Gorete do Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra.

Criado o tumulto, os policiais começaram a atirar para cima e contra os manifestantes. Pedestres, motoristas e passageiros dos ônibus que passavam pela avenida naquele momento entraram em pânico. Nas calçadas pessoas abaixadas, nos carros e ônibus, não se via mais ninguém. Foram minutos de terror presenciados por todos que estavam na Avenida Caxangá.

Durante a ação, a grande maioria dos manifestantes conseguiram entrar no Parque de Exposições do Cordeiro, onde estava a concentração e os ônibus. Crianças perdidas, mulheres desesperadas, algumas em estado de choque, foram aos poucos se encontrando dentro do Parque, e mais uma vez foram surpreendidas, desta vez por uma policial feminina que bateu e ameaçou as mulheres. “Quem diria que no dia das mulheres, nós íamos apanhar de uma policial. A que ponto chegamos”, denunciou Emília Nogueira, da Comissão Pastoral da Terra.

No final da ação, três militantes do MST, depois de espancados, foram presos e levados para delegacia do Prado. Ao darem entrada na delegacia, os policiais levantaram a acusação que os três militantes agredidos e presos teriam feridos os policiais. Um deles chegou a ser acusado de tentativa de homicídio. Este, Irailton Pereira de Morais, continua preso e já foi encaminhado para o Centro de Observação e Triagem Everaldo Luna (COTEL). Os outros dois, Eduardo Vitor da Rocha e Célio Costa Ferreira, foram liberados e fizeram exame de corpo de delito no Instituto Médico Legal. Eduardo Victor da Rocha , de 24 anos, conhecido como Motorzinho, levou sete pontos no rosto. Na versão apresentada pela polícia, dois PMs teriam sido agredidos, um teria quebrado o dedo e o outro teria sido atingido de raspão por um facão. Para Messilene Gorete, do MST, “Esta já é uma prática recorrente da polícia de Pernambuco. Não dá para ficarmos sendo vítimas da polícia, que faz o que quer contra os movimentos sociais e ainda justifica suas ações levantando acusações falsas”.

Cerca de meia hora depois da ação, chegou ao Parque de Exposições do Cordeiro uma comitiva do Governo do Estado formada pelos Secretários da Agricultura e Reforma Agrária, Ângelo Ferreira, de Articulação Social, Waldemar Borges, de Justiça e Direitos Humanos, Fernando Matos e pela Secretária da Mulher, Cristina Buarque. Os representantes do Governo se reuniram com mulheres que representavam a Via Campesina e advogados dos movimentos e que cobraram a responsabilidade do Estado na repressão promovida pela polícia.

De acordo com dados da Comissão Pastoral da Terra, em menos de noventa dias de governo já houve mais ações repressoras da polícia contra os trabalhadores e trabalhadoras rurais na luta pela reforma agrária do que o mesmo período do ano passado. “O governo após receber as denúncias tem agido e dialogado com os movimentos, como está fazendo agora, mas sempre correndo atrás do prejuízo. Não há ação preventiva, denuncia Marluce Melo, coordenadora da Comissão Pastoral da Terra. “O governo sabia que haveria a marcha das mulheres. O Secretário de Agricultura cedeu o espaço da secretaria para a concentração das camponesas. Perguntamos por que a polícia chegou logo atirando em uma avenida que movimenta milhares de carro? Afinal de contas quem é a autoridade para a polícia, o governador ou os proprietários de terra?”, questiona a Coordenadora da CPT.

Em nota, a Terra de Direitos, organização civil para os direitos humanos, questiona a prática das ações contra a violência que o Governo do Estado de Pernambuco vem divulgando na mídia desde que o novo Governador, Eduardo Campos, assumiu. “Enquanto o Governo divulga campanha para acabar com a violência contra a mulher, de outro lado a polícia espanca manifestantes”, diz a nota. No início de fevereiro, o Governador Eduardo Campos junto à Secretaria Especial de Políticas para as Mulheres, assinou termo de adesão ao Plano Nacional de Políticas para Mulheres, prevendo o enfrentamento à violência contra a mulher. Pernambuco é um dos estados que mais tem registro de violência á mulher. De acordo com a secretaria, foram registrados, no ano passado, quase 300 casos de morte feminina. Na última segunda feira, Campos lançou o Pacto pela Vida, mais uma ação para solucionar o problema da segurança pública no estado. Recorrente – Esta não é a primeira vez que o 08 de março é marcado pela violência da Polícia Militar de Pernambuco. No ano passado, o dia foi marcado por um violento despejo, na cidade de Cabrobó, sertão pernambucano, quando cerca de vinte mulheres e crianças foram presas e humilhadas na delegacia da cidade.

Marcha Unificada – Mesmo depois do ocorrido, as mulheres da Via Campesina participaram da marcha que uniu no centro do Recife cerca de 4 mil mulheres entre trabalhadoras rurais e urbanas. A marcha pedia o fim de violência contra a mulher e protestava contra a presença do presidente dos Estados Unidos ao Brasil, George W. Bush.

*Assessora de Comunicação da Comissão Pastoral da Terra PE

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