Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Organizações sociais, movimentos populares aglutinados em torno da Campanha Despejo Zero e partidos políticos protocolaram uma petição junto ao Supremo Tribunal Federal (STF), na noite desta quarta-feira (16), requerendo à Corte a prorrogação da liminar concedida pelos ministros que determinou a suspensão de despejos e remoções urbanos e rurais em razão da pandemia.

Dentro do âmbito da Ação de Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 828, de autoria do Partido Socialismo e Liberdade (PSOL) em parceria com as organizações, o ministro relator da ação, Luis Roberto Barroso, decidiu em junho do ano passado favoravelmente à suspensão dos despejos e remoções por seis meses, ou seja até dezembro de 2021. Em pedido de extensão da decisão feito em dezembro pelas organizações, o ministro prorrogou a decisão liminar por três meses, com validade então até 31 de março deste ano.

A petição pede a prorrogação da suspensão de despejos judiciais ou administrativos por mais seis meses, ou quando cessem os efeitos econômicos e sociais da pandemia, ou até que o mérito da ação seja julgado pelo plenário do Supremo.

Sem a prorrogação da decisão, cerca de 132.290 famílias distribuídas pelo país correm risco, neste momento, de sofrer despejo ou remoção, de acordo com a Campanha Despejo Zero. No documento os peticionários destacam que os impactos da pandemia têm sido ainda mais agudos para as populações negra, periférica, em situação de rua, carcerária e do campo.

De acordo com a pesquisadora Isabela Soares Santos, da Associação Brasileira de Saúde Coletiva (Abrasco) “são [estas] as pessoas mais vulnerabilizadas, em termos das condições de vida, as que apresentam os piores indicadores de Covid-19 quanto ao adoecimento, mortalidade e cobertura vacinal. São justamente essas pessoas que estão mais expostas ao risco de contaminação, exigindo uma estratégia urgente e efetiva que integre ações e políticas públicas de saúde, habitação e renda”, destaca.

Ameaçados

Ainda que paire um discurso de melhora do cenário pandêmico – com flexibilização de medidas de contenção do vírus – a manifestação desigual da crise sanitária e social nestas “ilhas de exclusão”, apontam os requerentes, exige um compromisso do Estado na execução de ações que garantam os direitos fundamentais, como a vida e moradia, para além dos momentos de maior intensidade da manifestação da doença. Um retrato da vulnerabilidade social e econômica atual é o apontado pela Campanha. Em agosto do ano passado foram mapeadas 18 mil famílias sob risco de despejo. Em fevereiro deste ano o número saltou para 132 mil, um aumento de 602%, o que evidencia o agravamento das condições de vida da população e uma cicatriz social que deve perdurar para além da crise sanitária.

“São milhares de famílias pobres, que ficaram numa situação ainda mais crítica desde o início da pandemia. O fato de que os despejos aumentaram em mais de 600% nesses dois anos, mesmo estando o país numa profunda crise social, mesmo as pessoas com risco de vida devido à pandemia do coronavírus, é extremamente desumano”, destaca Benedito Roberto Barbosa, coordenador da Central de Movimentos Populares (CMP) e integrante da Campanha Nacional Despejo Zero.

A avaliação é reforçada pela coordenadora de Incidência Política da Habitat para a Humanidade Brasil , Raquel Ludermir, “O que observamos nesses 2 anos de Campanha Despejo Zero é uma verdadeira bomba relógio: 132 mil famílias estão ameaçadas de perder seu teto, em um contexto em que a pobreza e a fome se aprofundam a cada dia”, diz. A liderança do Movimento dos Trabalhadores Sem Teto (MTST) sublinha que a prorrogação é necessária porque o país vive“ainda em um cenário de crise sanitária que não foi resolvida e de caos social e econômico”.

De acordo com Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST) a ausência de restrições à realização de despejos deve afetar fortemente o campo. “Para o MST, despejo a qualquer tempo é ato injusto e de violação aos direitos humanos. No entanto, despejo na pandemia é ato desumano, ainda mais com o agravamento da crise social no país. No campo serão atingidas pelo menos 30 mil famílias, com aproximadamente 20 mil crianças de até 12 anos”, destaca a integrante do MST e da Campanha, Ana Moraes.

Com diversos acenos e concessões ao mercado pelo legislativo e executivo federal para medidas que amplificam conflitos e desigualdades no campo e cidade, como a aprovação na última semana pela Câmara dos Deputados da urgência na tramitação do Projeto de Lei 191/2020, o Judiciário tem sido fundamental para garantir ações de proteção à população.

“Nesse ano eleitoral, há uma dificuldade ainda maior no Congresso Nacional, que não tem priorizado as pautas que defendem a vida da população e seu direito à moradia, ao contrário, tem avançado em projetos de lei que facilitam a grilagem e o desmatamento. Nesse cenário, apontamos que é fundamental a atuação do Supremo Tribunal, a fim de continuar garantindo os direitos das populações mais vulneráveis nesse cenário de crise social, econômica e pandemia, mantendo a suspensão dos despejos”, destaca a assessora jurídica da Terra de Direitos e integrante da Campanha Despejo Zero, Daisy Ribeiro.

A prorrogação da suspensão dos despejos pode garantir proteção a ocupações como o Acampamento Marielle Vive, em Valinhos (SP). Local de residência, produção de alimentos e recuperação de hortas e nascentes por 450 famílias há cerca de 4 anos, a área – antes improdutiva por seu proprietário cartorário – teve a ordem de reintegração de posse do Tribunal de Justiça de São Paulo adiada ao final do ano em razão da decisão do STF.

“A suspensão do despejo representou alívio para as famílias, mas segue a apreensão das famílias com o prazo de 31 de março de vigência da decisão de Barroso”, aponta Ana. De acordo com a Campanha, a liminar do STF garantiu a proteção de milhares de famílias. Somente os recursos que chegaram ao Supremo Tribunal Federal para garantir que decisões de tribunais e varas estejam alinhadas a liminar protegeram mais de 14 mil famílias

O tema também está em pauta no Conselho Nacional de Direitos Humanos (CNDH). Nesta quarta-feira (17), dia de mobilizações pelo país pela suspensão do despejo, o colegiado solicitou uma audiência com o ministro Barroso para tratar do assunto.

 

 

Fonte: Terra de Direitos

 

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