Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

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No país das commodities uma decisão inédita. Grandes redes de supermercado anunciaram, recentemente, a suspensão da compra de carne de áreas desmatadas. Entre as redes, encontram-se o Pão de Açúcar, o Carrefour e o Wal-Mart. A decisão atingiu a compra de carnes de 11 frigoríficos apontados pelo Ministério Público Federal do Pará como comercializadores de gado criado em área de devastação da Amazônia. Entre eles estão alguns dos maiores frigoríficos do país, como Bertin, Magrif e Friboi.

Cesar Sanson* Depois das redes varejistas, grandes indústrias, atacadistas e empresas de serviços também suspenderam compras de matérias-primas de pecuaristas acusados de criar gado em área de devastação ambiental na Amazônia. A decisão é inédita e o seu desfecho é resultado de uma bem sucedida campanha articulada pelo Greenpeace e Amigos da Terra. Este acontecimento é de particular importância considerando-se que Brasil é o maior exportador de carne bovina do mundo e atinge o interesse de grandes corporações.

Em nosso país há mais boi do que gente, 200 milhões de cabeças. Trata-se do maior rebanho bovino do planeta. Aqui também estão os maiores frigoríficos de abate, as maiores áreas de confinamento e o mais vasto processamento de carne. De cada três bifes consumidos no país, um vem da Amazônia. O boi está devorando a Amazônia. Motosserras e tratores pondo abaixo extensas áreas de florestas, toras de todos os tamanhos circulando em caminhões com enorme dificuldade, córregos e nascentes soterradas. No lugar das imponentes árvores, a pecuária e a soja extensiva. Até onde a vista alcança, a floresta amazônica vem dando lugar ao pasto.

A Amazônia Legal já responde por quase 40% da produção de carne e soja do país – região que concentra 36% da pecuária e 39% da cultura de soja nacionais.

O boicote à carne oriunda de áreas desmatadas é resultante da força dos consumidores e apresenta várias conquistas: a consciência crescente de que a pecuária é uma das principais responsáveis pelo desmatamento; de que a criação intensiva de gado incrementa o efeito estufa – o aquecimento global; de que a indústria do gado contamina e desperdiça água em volumes absurdos.

Há ainda os que chamam a atenção para o fato de que não se justifica a matança de animais para satisfazer os desejos de consumo humano, uma crítica ao especiecismo membros de nossa espécie que se consideram superiores a todas as outras espécies. Reconhece-se aqui que os animais têm direitos e que não podemos estabelecer uma relação meramente utilitarista com os mesmos.

O boicote ao consumo da carne oriundo de regiões desmatadas da Amazônia é uma vitória do crescimento da consciência de que vivemos em um planeta de recursos finitos. É uma conquista da tese do consumo como ato político.

Há ainda outro aspecto relevante nesse acontecimento: revela a força dos novos movimentos sociais”, ou seja, movimentos sociais que fazem uma crítica à sociedade industrial e a sua racionalidade economicista, produtivista, consumista e poluidora. Esses movimentos são portadores de novas bandeiras de lutas relacionadas à questão ecológica que se posta no centro da crise civilizacional. São movimentos articulados globalmente, que se vale de sofisticados recursos tecnológicos para levantar suas denúncias e se comunicar com parcela crescente da população que vem adquirindo uma consciência mais planetária, de que fazemos parte de uma comunidade humana com um destino comum.



(*) Pesquisador do Centro de Pesquisa e Apoio aos Trabalhadores e doutorando de Ciências Sociais na UFPR.

 

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