Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

O projeto de reforma do Código Florestal que tramita no Senado traz péssimas notícias para agricultores, para o Brasil e para o mundo: novos desmatamentos em milhões de hectares, liberação de estoques de carbono e manutenção de sistemas de produção atrasados e concentradores. As conclusões estão em estudo divulgado pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), órgão ligado ao Governo Federal.

O Ipea estimou a área de vegetação nativa que deixará de ser recuperada se for mantida a anistia ao desmatamento das parcelas de reserva legal nas propriedades de até quatro módulos fiscais.E estimou, também, outros cenários, considerando novos desmatamentos em função da anistia. 

Reserva legal é a porção da propriedade em que a vegetação natural deve ser mantida, de acordo com o Código Florestal em vigor. Ela é de 80% das propriedades na Floresta Amazônica, 35% nas manchas de Cerrado na Amazônia e de 20% nas demais regiões do país. 

O módulo fiscal é a área mínima que o agricultor precisa para desenvolver atividade econômica que garanta seu sustento e de sua família. O tamanho do módulo fiscal, diferente para cada município do País, é determinado considerando-se, entre outros fatores, as atividades econômicas comuns na região. O módulo fiscal varia de cinco hectares, no Distrito Federal, a 110 hectares na Amazônia. 

O texto em tramitação no Congresso Nacional prevê anistia a quem desmatou ilegalmente, estimulando novos desmatamentos. O projeto estabelece que os fazendeiros que têm até quatro módulos fiscais (até 440 hectares na Amazônia) e desmataram, até 2008, mais do que a lei permite, ficam desobrigados de recuperar a vegetação nativa nas reservas legais. 

Os técnicos concluíram que, num cenário otimista – considerando que não haverá novos desmatamentos em áreas de reserva legal - pelo menos 29 milhões de hectares de mata nativa – área semelhante à da Itália - deixarão de ser recuperados. Em outro cenário – considerando que haverá desmatamento futuro nas fazendas isentas de manter as reservas legais - o total de área desmatada pode chegar a 47 milhões de hectares – uma Espanha. Cerca de 60% da área que não precisaria ser recuperada se encontra na Amazônia. 

Nos outros biomas, grandes áreas desmatadas deixariam de ser recuperadas. Na Caatinga e na Mata Atlântica, metade de tudo o que foi derrubado ilegalmente em reservas legais não precisaria ser recuperado. No Pampa, 30%. No Cerrado, 22%. Na Amazônia, 14% e, no Pantanal, 3%. 

Em uma terceira hipótese, considerando que as reservas legais referentes a quatro módulos nas médias e grandes propriedades também sejam derrubadas, a devastação chegaria a 79 milhões de hectares – área maior que o Chile. 


Gases de efeito estufa


A proposta de reforma do Código Florestal também coloca em risco as metas brasileiras de corte nas emissões de gases de efeito estufa. Se não forem recuperadas as áreas de reserva legal que deveriam existir, de acordo com a legislação atual, e prevendo novos desmatamentos incentivados pelas anistias, deixarão de ser estocadas quantidades entre 17 e 28 vezes a meta brasileira de redução das emissões de gases estufa.

“A proposta em tramitação no Congresso é uma verdadeira bomba de carbono”, avalia o coordenador do programa de mudanças climáticas do WWF-Brasil, Carlos Rittl. “Trata-se de uma enorme ameaça para a biodiversidade brasileira, para as florestas e para o clima do planeta”, diz o especialista. 

O Brasil assumiu o compromisso de reduzir a curva de crescimento de suas emissões de gases estufa em entre 36,1% e 38,9% até 2020. O compromisso foi estabelecido na Lei 12.187/2009, que institui a Política Nacioinal sobre Mudança do Clima e foi também informado à Convenção-Quadro das Nações Unidas sobre Mudança do Clima. 

Como a anistia aos desmatadores funciona como incentivo a novas devastações e como a maior parte das emissões brasileiras é proveniente de desmatamentos e alterações no uso da terra, as metas brasileiras provavelmente não serão cumpridas. “As mudanças do Código Florestal tornam praticamente inviável ao Brasil atingir suas metas de redução de emissões”, avalia Rittl.

O texto em discussão coloca em risco, ainda, outro compromisso internacional do Brasil, de reduzir o desmatamento da Amazônia em 80% e do Cerrado em 40% até 2020, com base na média registrada entre 1996 e 2005. 

“A Rio+20, em 2012, irá tratar de caminhos para o desenvolvimento global sustentável. A Câmara dos Deputados, ao aprovar as mudanças no Código Florestal, agiu na contramão da história. E deixou o anfitrião da cúpula global, o Brasil, sob o risco de dar um péssimo exemplo ao mundo, ao aprovar a anistia aos crimes ambientais e a permissão a imensos desmatamentos”, diz o ambientalista.

A secretária-geral do WWF-Brasil, Denise Hamu, avalia que o Senado tem agora a oportunidade de mudar este quadro. “O Senado deve finalmente trazer para o debate as instituições de pesquisa, como SBPC, ABC, Embrapa, Ipea, representantes da agricultura familiar, da sociedade civil, todos extremamente preocupados com as propostas aprovadas na Câmara, para que se possa melhorar o Código Florestal, em vez de destruí-lo”. 

De acordo com Rittl, o Brasil deve corrigir o rumo de seu desenvolvimento: “Sustentabilidade e crescimento econômico baseado em baixas emissões de carbono são um caminho inevitável em nossa era. Isto deve ser visto como oportunidade para um país como o Brasil, com tantas riquezas naturais, e para os diferentes setores de sua economia. Pessoas, instituições, empresas e governos que não perceberem isso correm o risco de ficar à margem da história”, avalia.

Baixe aqui o estudo do Ipea (PDF).

 

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