Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

Na manhã dessa quinta-feira (25), foi realizada a Audiência Pública convocada pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (TJPE) para tentativa de conciliação dos conflitos agrários existentes na Mata Sul de Pernambuco, mais precisamente aqueles cujos processos judiciais tramitam na Comarca do município de Maraial. São 35 ações de reintegração e ações de usucapião as quais envolvem comunidades camponesas posseiras que há pelo menos 70 anos vivem em terras que passaram a ser exploradas e tomadas por empresários do setor sucroalcooleiro, pecuário e imobiliário.

Essa é a primeira vez que o TJPE, por meio do Núcleo de Conciliação (NUPEMEC), realiza mediação em conflitos agrários no estado de Pernambuco. A medida inédita reflete o reconhecimento por parte do poder judiciário e das autoridades de que a situação no local vem atingindo patamares insustentáveis em razão da acentuada violência no campo.

A audiência foi mediada pelo coordenador do NUPEMEC, desembargador Erik Simões, e pela juíza titular da Comarca de Maraial, Carolina Pontes de Miranda. Estiveram presentes: o Secretário estadual de Justiça e Direitos Humanos, Pedro Eurico; representantes do Programa de Proteção a Defensores e Defensoras de Direitos Humanos; o Promotor de Justiça de Promoção da Função Social da Propriedade Rural, Edson José Guerra; o Procurador do Estado de Pernambuco, Paulo Rosenblatt; representantes da Defensoria Pública; representantes do setor empresarial, representantes das comunidades atingidas pelos conflitos, entre outros. A CPT e a FETAPE também acompanharam a Audiência.

Na ocasião, não houve abertura para que agricultores e agricultoras pudessem ser ouvidos.  Apenas um camponês teve a oportunidade de fala. “Queremos permanecer em nossas terras e queremos que nos deixem em paz”, reivindicou Severino Amaro, morador da comunidade Batateiras, localizada no mesmo município. Perseguições, intimidações, destruições de lavouras e de fontes de água, esbulho de posse, ações de criminalização conduzidas pela Polícia Militar e Polícia Civil contra agricultores e agricultoras, prisões injustas, vigilância com drones, ameaças de morte e tentativas de assassinato são algumas das violências sofridas pela comunidade de Severino, e outras como Barro Branco e Fervedouro, em Jaqueira. Estima-se que são cerca de mil e quinhentas famílias vítimas dos conflitos agrários e que se encontram em situação de risco emergencial.

Por esse motivo, as organizações da sociedade civil que apoiam as comunidades chamaram a atenção dos membros do poder judiciário: não há como haver conciliação enquanto as famílias estiverem sob risco de morte. O agente pastoral da CPT, Plácido Junior, chegou a questionar, na ocasião, as circunstâncias da conciliação, uma vez que as agricultoras e agricultores enfrentam reais ameaças às suas vidas e às suas posses. A situação também foi reconhecida pelo Procurador do Estado de Pernambuco, Paulo Rosenblatt, o qual reforçou a existência de risco de morte, destacando a importância de assegurar um ambiente equilibrado, com a interrupção da violência por parte do setor empresarial, para dar continuidade à iniciativa do TJPE. Bruno Ribeiro, advogado da CPT e da Fetape, também fez o mesmo alerta. “Os direitos das famílias precisam ser preservados e as posses precisam ser respeitadas. Não pode haver negociação sem que seja precedida pelo respeito à vida”, completou.

Durante a audiência, as organizações sociais que acompanham o caso também ressaltaram que há outro tipo de conflito que deve ser visibilizado: o existente entre as Usinas, proprietárias das terras em questão, e o Estado. Segundo levantamento da PGE, existem dívidas multimilionárias junto à União e ao Estado que não são pagas por essas empresas, como é o caso da Frei Caneca, uma das partes nos processos judiciais tratados na audiência.

Para a Comissão Pastoral da Terra (CPT), os conflitos agrários na Mata Sul de Pernambuco não são desentendimentos individuais entre as partes envolvidas. São, na verdade, fruto de violências e desigualdades estruturais e consequência também da morosidade e omissão do poder judiciário. Tais conflitos só serão solucionados mediante ações e proposições não somente de reparação das violações, mas principalmente de garantia dos direitos historicamente negados a essas famílias camponesas. A presença do Estado de Pernambuco nesta iniciativa de conciliação, portanto, é fundamental.  

A audiência realizada hoje representa a abertura de um processo mais extenso de tentativa de conciliação, o qual conterá ainda outras etapas. Caso não sejam encontradas saídas para os conflitos por essa via, os processos continuarão aguardando tramitação na Comarca de Maraial.

 

Imagens: CPT Equipe Mata Sul

 

 

 

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