Os 50 anos da Comissão Pastoral da Terra (CPT) no Brasil foram celebrados na noite da última quinta-feira (7) durante uma mesa de homenagem realizada pela Universidade Estadual de Alagoas (Uneal) – Campus V, em União dos Palmares. A atividade, promovida pelo curso de Pedagogia, integrou a semana de acolhimento aos novos estudantes dos cursos de Pedagogia, Letras e Geografia.
A abertura do evento contou com a presença de professores universitários e representantes de movimentos sociais. Além da CPT, marcaram presença lideranças do Movimento dos Trabalhadores e das Trabalhadoras Rurais Sem Terra (MST), Frente Nacional de Luta (FNL), Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Branquinha, Federação dos Trabalhadores na Agricultura (Fetag) e a Comunidade Quilombola Muquém.
O professor Paulo Cândido iniciou as falas ressaltando a importância histórica e política da CPT. “A CPT é uma instituição que ofereceu e oferece essa contribuição fundamental para o Brasil, para o desenvolvimento e as mudanças políticas, institucionais e sociais para a organização das lutas no país inteiro e em Alagoas, inclusive na região serrana dos Quilombos”, afirmou.
Na sequência, o professor Anderson de Almeida Barros, vice-reitor da Uneal e reitor do Campus V, destacou o caráter social da universidade. “Esse momento é muito rico para a nossa instituição. A Uneal, que é conhecida no nosso estado como uma instituição de ensino superior voltada para as causas sociais. Eu me orgulho muito de fazer parte desse coletivo”, disse. Ele citou o exemplo recente da formatura de 210 indígenas no curso de Licenciatura Intercultural Indígena, reunindo 12 etnias de Alagoas: “É preciso dar visibilidade a tudo que a Uneal vem entregando para a sociedade, apesar as várias limitações nossas”.
Albertina Nunes da Silva, presidente da Associação da Comunidade Quilombola do Muquém, celebrou a conquista de vagas para quilombolas na universidade. “É uma satisfação estar aqui representando as comunidades quilombolas, onde nós quilombolas tivemos a grande conquista de conseguir vagas para cursarem aqui na Uneal. A pedagogia quilombola está sendo muito importante. Daqui para frente a gente vai ter muita gente formada dos quilombos e eu espero que essas oportunidades aumentem cada vez mais. A luta não é fácil, mas para aquele que corre atrás consegue. O que a gente quer é ser reconhecida, é ser vista. Comunidade quilombola não pode mais se esconder, tem que se mostrar presente”, afirmou.
Raquel Braz, secretária de Mulheres da Fetag/AL e presidenta do Conselho Estadual de Defesa dos Direitos da Mulher (CEDIM/AL), lembrou que “essa história vem de muitos anos e a gente tem que valorizar, porque se não fossem os movimentos, a gente não teria o que a gente tem hoje, por exemplo, a educação e o acesso à universidade”.
O coordenador nacional da CPT, Carlos Lima, apresentou a história da entidade desde sua criação, em 1975, em Goiânia, em pleno regime militar, até sua origem em Alagoas, em 1984. Inicialmente pensada como uma Comissão da Terra, a organização social assumiu seu caráter pastoral inspirada por bispos católicos, tornando-se a Comissão Pastoral da Terra. Nasceu como organismo ecumênico capaz de compreender os camponeses e assessorar suas lutas por terra, direitos e liberdade, além de incentivar seu protagonismo.
Em Alagoas, a realidade marcada pela monocultura da cana, as milícias e a pistolagem exigiram uma ação pastoral firme. Neste sentido, o primeiro serviço em Alagoas ocorreu junto aos assalariados da cana, com assessoria jurídica e incentivo às oposições sindicais em municípios como Colônia Leopoldina, Novo Lino, Judiá e Campestre.
Carlos Lima relatou episódios de extrema violência no campo, especialmente nos canaviais, onde os trabalhadores "canavieiros" enfrentavam, além da escravização, ameaças, agressões e até assassinatos. Foram mencionados casos assustadores de crueldade, como trabalhadores queimados vivos ou jogados nas caldeiras das usinas de cana-de-açúcar. Ele destacou que a CPT esteve presente em momentos decisivos, assessorando as ocupações de terras organizadas pelo MST no norte da Zona da Mata e no Sertão alagoano. Em 27 de novembro de 1998, aconteceu a primeira ocupação de terra com a CPT à frente: a ocupação da Fazenda Flor do Bosque, em Messias. Ali nasciam as ocupações coordenadas pela Pastoral da Terra no estado.
Durante sua fala, leu trechos do poema de Dom Pedro Casaldáliga que é encerrado com os versos: como "Bendita CPT, pastoral de fronteira, evangelho de risco, profecia pé no chão e enxada na mão e cantiga na boca dos Novos Céus e da Nova Terra!".
O dirigente do MST, Renildo Gomes, focou sua fala na defesa da reforma agrária popular e comentou que o movimento teve sua origem a partir da CPT no país. Já o coordenador da FNL, Marcos Marrom, afirmou: “Se o MST é filho da CPT, a FNL é neta”, reconhecendo o papel histórico da pastoral que fez e faz parte da luta da federação.
Mais que uma homenagem, a mesa foi um espaço de formação política e cidadã para os calouros. Ao conhecerem a trajetória da CPT e dos movimentos sociais, os estudantes puderam refletir sobre a importância de unir luta social e educação. Assim, a noite também apontou para a construção de uma pedagogia para a liberdade — uma educação comprometida com a transformação social, a dignidade humana e a esperança de um campo onde estudar, produzir e viver sejam direitos de todos e todas.