“Deus e dinheiro nos falam de
projetos de vida e de modelos
sociopolíticos opostos, antagônicos."
(CF 2007, texto-base, 292).
A Campanha da Fraternidade é um gesto profético da Igreja no Brasil ajudando os cristãos e toda a sociedade a refletir sobre temas da maior relevância social. Neste ano, traz para o centro das atenções a Amazônia, sua rica biodiversidade, sua pluralidade étnica e os conflitos que a envolvem..
Quando todo o mundo se dá conta das graves e severas consequências do aquecimento global, fruto do modelo de desenvolvimento capitalista, predador dos recursos naturais que não respeita os limites da natureza, a Campanha da Fraternidade veio se encaixar perfeitamente nesta discussão convocando para uma reflexão séria sobre a necessidade premente de um desenvolvimento respeitoso do meio-ambiente. Ela veio se somar ao grito de multidões que querem um desenvolvimento harmonioso, respeitando natureza e povos.
O texto-base da Campanha da Fraternidade centra a reflexão sobre o conhecimento dos povos e comunidades tradicionais, da Amazônia - índios, quilombolas, ribeirinhos, extrativistas e colonos que, nos últimos anos, foram trazidos de todos os cantos do Brasil dentro dos programas de desenvolvimento dos governos militares.
Mas, para nosso espanto, entre o discurso do texto-base e a prática manifestada no ato de lançamento da Campanha, há uma contradição muito grande. A organização do lançamento foi entregue a uma empresa de eventos. O lançamento será numa ilha. A participarão no mesmo será restrita aos que tiverem convites. O embarque para a ilha será nas Docas, local reservado para as elites do Pará, e todo o evento terá o patrocínio da Companhia Vale do Rio Doce. O povo, apresentado como centro no texto-base com sua rica diversidade de culturas e religiões, onde estará? Não é contemplado na programação. Será um grande evento para poucos selecionados e longe da vida das populações amazônicas.
O mais grave, no nosso entender, é que este lançamento seja patrocinado pela Companhia Vale do Rio Doce que é uma das principais responsáveis pela destruição ambiental e por conflitos com as populações tradicionais da Amazônia.
Em primeiro lugar, a Vale é um dos símbolos da malversação do patrimônio público brasileiro, através do processo de privatização acontecido anos passados. O caso da Vale é tão gritante que a própria Igreja, através do Grito dos Excluídos e da 4ª Semana Social Brasileira, junto com outros movimentos e entidades da sociedade civil, se comprometeu em propor um plebiscito popular para a anulação do leilão da Vale, plebiscito que está agendado para a Semana da Pátria, neste ano, coincidindo com a realização do Grito dos Excluídos. Sabendo disto, a Vale está investindo por todos meios na sua própria propagando, para se contrapor ao plebiscito programado.
A imprensa nacional noticiou nos últimos meses as ações dos índios Xicrin contra a Vale, e como esta cortou todos os repasses de recursos contratados com os indígenas, só voltando a efetuar os mesmos por decisão judicial. Também a imprensa noticiou o conflito da Vale com a Comunidade Quilombola do Jambuaçu, no município de Moju, PA. Só depois de semanas de protesto é que a Vale se sentiu obrigada a atender as reivindicações das comunidades afetadas pelas obras de interesse da empresa.
Mas é com relação ao meio-ambiente que a Vale apresenta maiores problemas, embora ela propale o contrário. A Vale tem viabilizado a construção de uma série de siderúrgicas na Amazônia que utilizam o carvão vegetal para a produção do ferro-gusa. Segundo o cálculo de ambientalistas e de outros estudiosos são praticamente 300 mil hectares de floresta primária que a cada ano são destruídos para a produção de carvão. Algumas dessas siderúrgicas já foram flagradas e multadas pela fiscalização do Ministério do Trabalho por manter centenas de trabalhadores como escravos em suas carvoarias, inclusive crianças.
Como é possível que a CNBB aceite o patrocínio de uma empresa como esta para o lançamento de uma Campanha que quer chamar a atenção para a defesa e a preservação do meio ambiente, e para a valorização das comunidades e povos tradicionais da Amazônia?
Diante disto, decidimos não participar do ato de lançamento, como protesto pela forma como foi organizado, sobretudo pela ausência do povo, o principal sujeito da Campanha da Fraternidade. Mas nem por isso a deixamos de lado. Estamos totalmente empenhados em trabalhar com afinco nesta Campanha buscando que seu verdadeiro espírito penetre as mentes e os corações de todas as pessoas, e as instituições de nosso País.
16 de fevereiro de 2007
Articulação Nacional da Pastoral da Mulher Marginalizada
Comissão Dominicana de Justiça e Paz do Brasil
Comissão Pastoral da Terra - CPT
Conselho Nacional do Laicato do Brasil – CNLB
Grito dos Excluídos
Grito dos Excluídos/as Continental
Pastoral da Juventude Rural - PJR
Pastoral do Menor
Serviço Pastoral dos Migrantes - SPM