Segundo ele, "mais grave ainda é o processo de negociação destes direitos, chegando ao cúmulo de o ministro da Justiça anunciar publicamente que os direitos dos indígenas precisam ser ajustados (ajustados, logicamente, aos interesses daqueles que efetivamente tem a máquina pública sob seus domínios)". O indigenista concluí que "a política indigenista do governo federal tem, ao que parece, a intenção de manter os povos indígenas numa situação de exclusão, pois cotidianamente lhes nega os direitos fundamentais à vida, a terra, ao alimento e a cidadania. E, num contexto de disputas eleitorais, essa política torna-se anuncio, sem constrangimento, indicando do lado de quem o governo pretende ficar". Eis o artigo. ano eleitoral as barganhas políticas são as regras. Nada deve comprometer os acordos, conchavos, apoios e os financiamentos públicos e privados para as candidaturas políticas. Essa estrutura é tão perversa que inviabiliza as possibilidades de que pessoas sérias e comprometidas com as causas sociais disputem eleições. A regra, portanto, impõe o atrelamento de questões econômicas e sociais à politicagem. Nesse sentido, a presidente da RepúblicaDilma Rousseff – juntamente com seu partido político – optou por paralisar os procedimentos de demarcação das terras indígenas e quilombolas, e o fez para não desagradar certos setores a ela articulados, que também “apadrinham” sua candidatura à reeleição. Assim, a presidente vem mostrando concreta e inegavelmente quais são as suas prioridades ao governar. A Fundação Nacional do Índio (Funai) comandada por uma presidente interina há mais de um ano, acatou a determinação da chefe do poder Executivo e, ao longo de quase dois anos, não demarcou nenhuma terra. Talvez seja por interina e comandar o órgão indigenista oficial de modo provisório, a presidente da Funai não manifesta descontentamento, não se compromete com os povos indígenas e aceita a estagnação como regra. A Funai, que deveria demarcar as terras indígenas, protegê-las e fiscalizá-las, permanece alheia aos graves conflitos de que são vítimas os povos indígenas de diferentes regiões brasileiras. O mesmo ocorre com o Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) no tocante aos territórios quilombolas, ou seja, a política de omissão vigora, mesmo com as garantias legais e as responsabilidades atribuídas a este órgão oficial. A determinação de paralisar as demarcações está em sintonia com outros tantos aspectos nefastos da política indigenista executada ao longo dos 12 anos de governos petistas (oito anos de governo Lula e quatro de Dilma), destacamos alguns pontos destes governos: as violações aos direitos individuais e coletivos dos povos indígenas, a manutenção de comunidades às margens das estradas; a falta de compromisso com a vida e com a dignidade de tantas famílias que permanecem sem terra, sem alimentos, sem água potável, sem saneamento básico; a manutenção de uma situação indigna de confinamento de grandes contingentes populacionais em áreas exíguas, a continuidade de uma política de omissão que gera, em muitas comunidades indígenas, os mais altos índices de mortalidade infantil de desnutrição, de morbidade, de suicídio; às constantes ameaças de morte e agressões a indígenas que lutam por seus direitos assegurados na Constituição Federal. Em Mato Grosso do Sul especialmente as comunidades Guarani, Kaiowá e Terena enfrentam essas adversidades de forma mais intensa e direta, pois lá as terras foram disponibilizadas para o agronegócio – cria-se boi, planta-se soja, milho e cana-de-açúcar, afirma-se que só um modelo de produção em larga escala justificaria a posse da terra e conduziria o Brasil à sua vocação para ser uma grande nação. Neste e em outros estados da federação, os investimentos públicos têm a finalidade de assegurar que o agronegócio mantenha sua “vitalidade” independentemente da localização geográfica, fundiária e sua condição jurídica – terras públicas, terras indígenas, terras quilombolas, terras griladas, terras tituladas, terras arrendadas estão à disposição desse setor da economia. Demarcar as terras indígenas seria ir de encontro aos interesses imediatos daqueles que tem dado as cartas do jogo no atual governo; significaria o estabelecimento de um confronto (político e econômico) que a presidente Dilma já demonstrou não estar disposta a enfrentar.
A opção política da presidente da República em governar a partir de alianças eleitoreiras e mercantilistas impuseram aos povos indígenas e quilombolas o esvaziamento do alcance dos seus direitos constitucionais. Mais grave ainda é o processo de negociação destes direitos, chegando ao cúmulo de o ministro da Justiça anunciar publicamente que os direitos dos indígenas precisam ser ajustados (ajustados, logicamente, aos interesses daqueles que efetivamente tem a máquina pública sob seus domínios).
Com essa nova concepção “dos ajustes de direitos”, o governo propõe que os povos e comunidades indígenas renunciem ao direito sobre terras já demarcadas, como ocorreu em Mato Preto, terra tradicional Mbya Guarani, de 4.230 hectares, que o governo pretende reduzir para 650 hectares e em Passo Grande de Rio Forquilha, terra do povoKaingang, ambas no Rio Grande do Sul. Além disso, com o intuito de dificultar os procedimentos de demarcação especialmente aqueles que estavam em fase de conclusão - o ministro da Justiça, no ano de 2013, estabeleceu que as demarcações de terras fossem discutidas em mesas de diálogos - compostas por agentes do governo, indígenas e setores diretamente interessados nas terras em questão. A criação das tais meses, em essência, teve o intuito de protelar as demarcações; desgastar o movimento indígena em luta pela terra; acirrar as disputas entre indígenas e os ocupantes de suas terras. É importante destacar que muitos ocupantes de terras indígenas reconheciam a legitimidade das demarcações e aguardavam o pagamento das indenizações (justas e devidas). No entanto, depois das tais mesas de negociações, passaram a contestar as demarcações e articular formas de resistência a elas, inclusive com o uso da violência e da discriminação étnica. A situação fundiária é inegavelmente o centro dos conflitos – demarcação e regularização das terras – e todos os demais aspectos da política assistencial (a ser prestada aos povos indígenas) estão condicionados às demandas fundiárias. Ou seja, quando o governo negligencia o direito a terra, acaba fragmentando e fragilizando o alcance das demais normas legais que assegurariam uma política diferenciada e específica para as populações indígenas. Essa concepção de política indigenista posta em prática no Brasil impõe aos povos indígenas a pecha de que eles são um “estorvo” e, como tal, precisam ser removidos ou excluídos. A política de assistência à saúde indígena que vem sendo executada no Brasil é um bom exemplo para demonstrar como, na prática, os povos e comunidades são colocados ou relegados a exclusão. O governo, por força de lei e pela pressão do movimento indígena, criou o Subsistema de Atenção à Saúde com base em distritos sanitários especiais indígenas e desde 2010 vem tentado organizar uma Secretaria Especial de Saúde Indígena (Sesai) - gestora do subsistema. No entanto, não se verifica - apesar da lei e das estruturas criadas – melhorias nas condições de saúde das populações indígenas porque a prioridade dada a política são para assegurar a manutenção da máquina administrativa – recursos, contratos, fornecedores e servidores - e a perspectiva da terceirização de serviços e o esvaziamento das ações nas comunidades, especialmente as que deveriam ser duradouras como a prevenção e formação. Dentro dessa concepção os servidores públicos e os funcionários terceirizados vinculam-se a uma política assistencial descolada das pessoas e desvinculada da realidade. Os povos indígenas de Mato Grosso do Sul denunciam que nas aldeias e acampamentos dos Guarani e Kaiowá, os agentes e servidores