Comissão Pastoral da Terra Nordeste II

"Não sou livre enquanto qualquer mulher é prisioneira, mesmo que as correntes dela sejam diferentes das minhas." - Audre Lorde, escritora, poetisa e filósofa negra estadunidense

Por ocasião ao 08 de Março, Dia Internacional de Luta das Mulheres, nós, mulheres negras, indígenas, quilombolas, racializadas, jovens, adultas, anciãs e LGBTQIAP+, que estamos enraizadas nas lutas dos povos da terra, das florestas, dos campos e das águas e nas lutas feministas em todos os estados brasileiros, juntamos nossas vozes às vozes de tantas outras mulheres das cidades, campos e das florestas.

Ecoamos nossas vozes contra todas as formas de violências e violações dos corpos-territórios das mulheres; contra as desigualdades estruturais produzidas pelo patriarcado racista desde a era colonial; contra o retrocesso aos nossos direitos que nos garantem vida digna e contra todas as formas de ataques às mulheres. Também externamos anúncios em defesa da vida com justiça social e fortalecimento dos processos de autonomia das mulheres, nas organizações e nas comunidades; nos alegramos com a vitória de muitas companheiras negras, quilombolas e indígenas no processo eleitoral de 2022, companheiras que passaram a ocupar espaços no legislativo e no executivo estadual e federal. Por tudo isso trazemos a todes as nossas preocupações, permeadas por nossas próprias reflexões e vivências.

Iniciamos o ano de 2023 cheias de esperança, mas apreensivas e vigilantes quanto ao rumo das políticas de proteção e fortalecimento da autonomia das mulheres. Não podemos esquecer que, vivemos num sistema político e econômico que reforça o que tem de mais perverso nas relações sociais, permeadas pelo machismo, misoginia, racismo e homofobia; a precarização do trabalho e a mercantilização da força de trabalho e dos bens comuns; a supremacia do individualismo e a desvalorização das mulheres e suas lutas coletivos.

Ao longo da história, as mulheres estiveram na linha de frente de muitas lutas por direitos e vida digna para os mais empobrecidos, e, de tal maneira, reivindicamos engajamento para reverter todo o retrocesso instaurado após o golpe de 2016 contra a presidenta Dilma Rousseff, onde o capitalismo e o machismo, mais uma vez, saíram vitoriosos. Com o aprofundamento da crise sanitária, climática e econômica no Brasil e no mundo, somado à política da fome, do desemprego e da barbárie conduzida pelo governo Bolsonaro, tem tornado nossas vidas ainda mais difíceis, uma vez que, somos nós, as trabalhadoras do campo e das cidades, as mais impactadas por todas essas formas de violências. Segundo o Anuário de Segurança Pública de 20221, no período entre 2016 a 2021, 7.258 mulheres foram mortas pela condição de ser mulher, vítimas de feminicídio. Nesse cenário de injustiças, 33 milhões de pessoas estão no “Mapa da Fome” no país, e 19,3% dos lares chefiados por mulheres negras e pardas estão em situação de insegurança alimentar grave. Esses dados reforçam o chamado da Campanha da Fraternidade da CNBB deste ano, que tem como tema “Fraternidade e Fome” e o lema “Dai-lhes vós mesmo de comer” e a tese de que, “a fome e a desigualdade social têm cor, gênero e endereço”2.

No contexto específico do campo, as mulheres de povos, comunidades tradicionais e camponesas, além da violência doméstica, empobrecimento e das opressões do patriarcalismo e machismo familiar, religioso e comunitário, estão expostas a outras formas de violência, a expropriação dos territórios, a destruição dos bens comuns que são fundamentais para manutenção de seus modos de vida. No período de 2011 às 2021, a CPT registrou 80 tentativas e 39 assassinatos de mulheres em conflitos fundiários e socioambientais. Além disso, foram registradas diversas outras formas de violências contra as mulheres: agressões, ameaças de morte, detenções, estupros, lesões corporais, humilhações, intimidações e prisões.

É contra essa realidade que, o Coletivo de Mulheres da CPT fortalece a insurgência feminina a partir das experiências de luta vividas pelas mulheres negras, quilombolas, indígenas, ribeirinhas, extrativistas, quebradeiras de coco, camponesas e LGBTQIAP+, mantendo viva a memória da rebeldia protagonizada por Maala, Noa, Hogla, Milca e Tirza, como referência bíblica e pastoral.3

Assim, afirmamos a necessidade de reconhecimento e visibilidade das nossas capacidades intelectual e financeira, com autonomia e liberdade de ser e viver em um mundo sem violências, tendo direitos à terra e territórios e a segurança alimentar e nutricional. É com convicção que afirmamos que, a luta das mulheres é por uma sociedade mais justa e igualitária, sem hierarquia de poder e sem opressões que impedem os corpos-territórios livres!

Coletivo de Mulheres da CPT

 

 

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